ARGUMENTO  
Informativo Argumento | Veja em seu navegador!

   Edição 115 - Maio/Junho - 2020

 
 
 

TRABALHISTA

A demissão por “força maior” em época de pandemia

Com o cenário de pandemia que assola o mundo atual, a paralisação de atividades não essenciais foi uma das principais medidas adotadas pelo Governo Federal, para conter os avanços do coronavírus (Covid-19). Por consequência, muitas empresas se encontram com dificuldades financeiras para manter seu negócio e empregados.

No caso de o empresário não conseguir resistir a este período, e ter que extinguir sua empresa ou um de seus estabelecimentos em que trabalhe determinado empregado, fica caracterizado, assim, o desligamento “por força maior”, conforme artigo 502 da CLT, reduzindo assim, suas obrigações trabalhistas.

Este dispositivo tem sido cada vez mais aplicado em meio à pandemia, pois, quando comprovada que a demissão se deu “por força maior”, ou seja, pelas restrições impostas pelo Governo no combate ao coronavírus, a multa do FGTS é reduzida para 20%.

“Essa modalidade de rescisão, no entanto, vinha apresentando problemas quando colocada em prática, pois impedia o ex-empregado de sacar FGTS, e por consequência, dificultava o acesso ao seguro desemprego, tendo em vista que este é liberado após o saque do fundo de garantia”, explica a especialista em Direito Trabalhista, Mayara Agrela.

Isso ocorria porque o artigo 18 da Lei 8.036, de 1990, responsável por dispor sobre o Fundo de Garantia, em seu parágrafo segundo, ao discorrer sobre a redução da multa fundiária para 20%, aduz que "quando ocorrer despedida por culpa recíproca ou força maior, reconhecida pela Justiça do Trabalho".

Resta claro, ao analisar o artigo, que o saque o FGTS está condicionado à apresentação de decisão transitada em julgado, o que foi, inclusive, informado pela Caixa Econômica Federal, ao afirmar que “por lei há necessidade de reconhecimento da Justiça do Trabalho para as rescisões de contrato com motivo de força maior e somente após o processo o FGTS é liberado ao trabalhador.”

“Logo, os empregados que estavam sendo demitidos ‘por força maior’ em face à pandemia, precisariam entrar com uma ação trabalhista, para que houvesse uma decisão reconhecendo a “força maior”, resultando em um grande aumento no passivo trabalhista das empresas, e demora para o saque de FGTS dos ex-empregados”, afirma a advogada.

Diante deste cenário, foi publicado no Diário Oficial da União de 29/04/2020 a Circular nº 903 da Caixa Econômica Federal, que altera o Manual FGTS, dispensando o ex-empregado de apresentar decisão emitida pela Justiça do Trabalho reconhecendo a rescisão por força maior, sendo necessário apenas a apresentação documento de identidade, CPF e carteira de trabalho.

 


Mudanças da MP 927/2020 referentes a doença ocupacional

Recentemente, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, em decorrência das diversas ações diretas de declaração de inconstitucionalidade intentadas, decidiu, por maioria, negar eficácia ao artigo 29, da Medida Provisória nº 927/2020 que dispõe: “Os casos de contaminação pelo coronavírus (covid-19) não serão considerados ocupacionais, exceto mediante comprovação do nexo causal.”.

Diante da decisão da Suprema Corte muitos passaram a indagar se todo e qualquer caso de contaminação pelo coronavírus seria então considerado como doença ocupacional.  

O artigo 20 da Lei nº 8.213/91 considera acidente do trabalho entidades mórbidas enquadradas como doença profissional ou doença do trabalho. Todavia, em conformidade com o artigo 20, § 1º, alínea “d”, da Lei n° 8.213/99, não se considera como doença do trabalho: “a doença endêmica adquirida por segurado habitante de região em que ela se desenvolva, salvo comprovação de que é resultante de exposição ou contato direto determinado pela natureza do trabalho.”.

“Assim, à luz do referido dispositivo legal, a contaminação pelo coronavírus tão somente pode ser considerada como doença do trabalho se estiver diretamente relacionada com o exercício do trabalho”, explica a advogada trabalhista, Sandra Lucia Bestlé Asselta.

Prevalecesse o teor do artigo 29 da MP 927/2020, caberia ao empregado a prova quanto à contaminação do coronavírus no trabalho, violando o direito à proteção da saúde do trabalhador.

A decisão do STF foi no sentido de afastar do trabalhador tal ônus, dada a dificuldade de produção de prova nesse sentido. “Seria praticamente impossível ao trabalhador desincumbir-se do referido ônus, eis que, não há como comprovar o momento ou as circunstâncias em que teria ocorrido a contaminação pelo coronavírus”, afirma a advogada.

Diante disso, será possível o reconhecimento de doença ocupacional decorrente da contaminação do coronavírus, nos casos em que o trabalhador, em face da natureza do seu trabalho, esteja em contato direto com o referido vírus, como, por exemplo, os profissionais da saúde, quais sejam, médicos, enfermeiros, dentistas, entre outros.

Importante destacar que o Supremo Tribunal Federal confirmou anteriormente a possibilidade da caracterização da responsabilidade objetiva do empregador por danos decorrentes de acidentes de trabalho pelo exercício de atividade de risco na execução do contrato de trabalho, nos termos artigo 927, parágrafo único da CLT.

Vale dizer, em tais circunstâncias, bastará a comprovação de dano e do nexo causal com as atividades desenvolvidas, independente da culpa (Tema 932), exceto se o empregador demonstrar a culpa de terceiro ou força maior.

O reconhecimento da doença ocupacional, além do direito ao benefício previdenciário, ensejará o direito à estabilidade no emprego de dozes meses, após a cessação do afastamento (Lei 8.213/91, art. 118), a obrigatoriedade de recolhimento dos depósitos do FGTS, aplicação de multas, bem como, a cobrança de indenização por danos morais e materiais, e até mesmo, poderá constituir ilícito penal.

“Destarte é importante que o empregador dê cumprimento às normas de segurança, higiene e medicina do trabalho, adotando todas as medidas necessárias no sentido de prevenir a contaminação do coronavírus”, finaliza Sandra Asselta.

 

« Voltar